Um Lugar Sagrado Pode Adoecer

“Na medida em que (o conceito de) Lugar no Mundo torna-se sinônimo de espaços significativos, isto certamente nem sempre é benéfico (Gordon, 2008)”.

Contrariamente aos profundos ensinamentos do Mahayana sobre a Sabedoria da Não-Distinção, muitas vezes um organismo cai vitima de sua própria identidade, ou ego.

Em seu artigo Towards a Theory of Network Locality, Eric Gordon tece a consideração que: “Esses espaços significativos (‘Lugares no Mundo’) podem ser usados para exercer o poder dentro de contextos geograficamente definidos. Eles estabelecem distinção entre aqui e ali, nós e eles. Aqueles que compartilham um Lugar no Mundo podem optar por abri-lo aos recém-chegados, ou podem fechá-lo para si, criando efetivamente uma hierarquia de autenticidade local. ‘Você pode viver aqui, mas não vive aqui autenticamente’. Em comunidades antigas, isto pode levar à mútua exclusão entre ‘nativos’ e ‘forasteiros’, ou veteranos e novatos. Esses espaços também podem ser produzidos no que concerne à raça, classe ou gênero. Diferenças de aparência exterior podem ser usadas para excluir recém-chegados” .

Nesse caso, pode-se evocar a sinonímia de secretar (fazer segredo) e segregar (apartar), cuja essência maléfica atacará o tecido conjuntivo daquela comunidade e, como uma doença auto-imune, destruirá a relação causal da sua própria origem, da sua razão de ser, e também poderá destruir as sementes para a iluminação daquele coletivo [ver “A Origem de um Lugar Sagrado”]. Em passagem do Sutra de Lótus, Capítulo 03 – A Parábola, o Buda admoesta Shariputra:

“Além disso, Shariputra,

para os arrogantes,

indolentes e aqueles que nutrem visões próprias,

não pregue este Sutra.

Pessoas comuns de escassa compreensão,

profundamente apegadas aos Cinco Desejos,

ouvindo-o, falharão em compreender;

não o pregue para eles, quem quer que sejam.

Se houver aqueles que não compreendem,

e que caluniam este Sutra,

em conseqüência,

eles destruirão todas as sementes para o Estado de Buda.”

E no Sutra do Nirvana, Capítulo 21 – Sobre Ações Puras 1, para o benefício de Kashyapa, o Buda diz num gatha:

“Se não se sente a ira,

mesmo contra um simples ser,

e roga-se para dar felicidade a esses seres,

isto é amor-benevolente.

Se sente-se compaixão

por todos os seres,

isto é a semente sagrada.

Interminável é a recompensa.”

Isto tudo nos leva à compreensão da sucumbência de algumas ditas “organizações” pretensamente propaladoras de um ensinamento que, na verdade, não assimilam. Eis porque certas entidades surgem com ímpeto revolucionário, e depois ruem sob o próprio peso. Esses fenômenos resultam de relações sociais doentias, e podem macular aquele “Lugar no Mundo”. Todavia, o Dharma é Eterno.

Por muccamargo

Físico, Mestre em Tecnologia Nuclear USP/SP-Brasil, Consultor de Geoprocessamento, Estudioso do Budismo desde 1987.

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