Em ‘Um Diálogo Frívolo Acerca da Grande Lei’
Naquela ocasião, PI era uma jovem entusiasta, mas diante da perplexidade da situação criada por IZ, com o orgulho ferido, retroagiu, ficou de lado e desapareceu do cenário, acredita-se que durante muitos séculos, selando um longo e profundo silêncio. Esse é um problema de todos os ideogramas quando se colocam de lado ou se deitam. Acontece também quando se lhes olha de forma unilateral.
Durante aquele tempo, PI vagou entre muitas culturas, outras terras, outros mundos, tendo seu significado não compreendido e corrompido, ao ponto de ser considerado uma importante grandeza da matemática, uma constante universal, mas vejam: uma dízima não-periódica, constante mas inexata, um ícone da imperfeição.
Não era isso que PI almejara e buscara em seus “insights”. Aliás, observem a sua semelhança com IZ. Pode-se dizer que possuem a mesma natureza. A diferença mais notável é que, ao contrário de IZ, a mente de PI é obliterada por uma espécie de laje sobre si, a qual se diz ser muito pesada. Por essa razão, de há muito PI vinha buscando caminhos para remover essa obstrução e, colocados os “pingos nos is”, tornar-se plural e desobstruído como IZ.
Em suas andanças, certo dia, PI encontrou uma antiga escritura intitulada “O Sutra de Lótus”, da qual já havia ouvido falar, mas que lhe parecia muito distante. Dado à sua angustia, mergulhou em seu estudo, onde viria a ler:
“Honrado pelo Mundo, em razão dos três tipos de sofrimentos, temos passado muitos tormentos entre os nascimentos e as mortes. Enganados e ignorantes, apegamo-nos às Leis menores.”
“Hoje, o Honrado pelo Mundo forçou-nos a pensar sobre abandonarmos o estrume das discussões frívolas sobre a Lei. Aumentamos a nossa capacidade para merecer o pagamento do dia do Nirvana. Tendo alcançado isto, nossas mentes exultaram enormemente, ficamos contentes, dizendo para nós mesmos que, através da diligência e do vigor, aquilo que tínhamos ganhado na Lei do Buda era abundante.”
“Todavia, o Honrado pelo Mundo, tendo conhecimento pleno de que nossos pensamentos estavam apegados aos desejos inferiores e se deleitavam nas Leis menores, deixou-nos seguir nossos próprios caminhos e não especificou para nós dizendo: ‘Todos vocês terão uma parte no tesouro da sabedoria e da visão do Tathagata’.”
“O Honrado pelo Mundo, usando o poder dos meios hábeis, falou da sabedoria do Tathagata. Ao ganhar do Buda o pagamento do dia do Nirvana, tomamo-lo como se fosse uma grande conquista, não tendo mais ambição de buscar o Grande Veículo. Ademais, a sabedoria do Tathagata era empregada em prol dos Bodhisattvas, e assim não tínhamos expectativas com relação a ela. Qual é a razão? O Buda sabia que nossos pensamentos se deleitavam nas Leis menores. Então, ele se utilizou dos meios hábeis para nos ensinar da maneira apropriada, e nós não compreendemos que éramos verdadeiramente os filhos do Buda.”
“Agora, sabemos que o Honrado pelo Mundo não é de forma alguma egoísta com a sabedoria do Buda. Por quê? Desde os primórdios, éramos verdadeiramente os filhos do Buda, mas, mesmo assim, deleitávamos somente nas Leis menores. Se tivéssemos pensado em deleitar na Grande Lei, o Buda então teria pregado para nós a Lei do Grande Veículo. Este Sutra prega somente o Veículo Único. No passado, na presença dos Bodhisattvas, o Buda havia depreciado os Ouvintes que deleitavam nas Leis inferiores, mas ele efetivamente estava empregando o Grande Veículo no ensinamento e conversão deles.”
Sutra de Lótus – Capítulo 4 – Fé e Compreensão.
PI lia e relia esse trecho do sutra. Perguntava-se: ‘Por onde andei?’ E passou a meditar: ‘Fui um tolo ao sentir meu orgulho ferido, e me deixar levar daquela maneira por um sentido de autoimportância desmedida. Por que agi daquela forma com IZ? Dei-lhe o flanco, saí de cena, sem sequer lhe dar a oportunidade de me ensinar. Devo procurá-lo agora mesmo’.