“Oh bom homem! Por exemplo, existe uma situação onde obtemos a consciência visual através da combinação harmoniosa dos olhos, cores, luz e pensamento. Oh bom homem! Os olhos não pensam: ‘Eu farei a consciência surgir’. As cores (que juntamente com a luz são estímulos externos), pensando, nunca dizem: ‘Eu farei a consciência visual surgir’. Nem a consciência diz: ‘Eu surgirei por mim mesma’. Oh bom homem! Essa harmonização das relações causais das leis [isto é, dos dharmas] é drsti [visão]. Oh bom homem! O mesmo é o caso com o Tathagata. Através da combinação harmoniosa das relações causais dos seis paramitas, obtemos drsti [visão]. Oh bom homem! É o mesmo com o Tathagata. Ele perscruta as profundezas de todas as coisas por meio dos seis paramitas e os 37 elementos em prol da Iluminação. Também, nós a chamamos de Giro da Roda-da-Lei, como se ela (a Iluminação), usando a garganta, a língua, os dentes, os lábios e a boca, e através da fala e da voz, falasse do Dharma para Kaundinya e os outros. Este é o porquê não se diz que o Tathagata gira a Roda-da-Lei. Oh bom homem! Aquilo que não é girado é Dharma, Dharma é o Tathagata. Oh bom homem! Através do uso do sílex (pederneira), por meio do atrito, por meio do uso das mãos, usando o capim seco do outono, obtemos o fogo. Mas o sílex não diz: ‘Eu fiz o fogo surgir’. O atrito, as mãos e o capim seco também não pensam: ‘Eu fiz o fogo surgir’. Nem o fogo diz: ‘Eu surgi por mim mesmo’. O mesmo se passa com o Tahagata. Através dos seis paramitas, para falar a Kaundinya, ai ocorre o giro da Roda-da-Lei. Mas o Tathagata, também, não pensa e diz: ‘Eu giro a Roda-da-Lei’. Oh bom homem! Falamos do ‘não-advento’ [não-surgimento, não-ação]. Este é o correto giro da Roda-da-Lei. Este giro da Roda-da-Lei é o Tathagata.
Oh bom homem! Um exemplo: a partir da nata, da água, da batedeira, de um pote e das mãos de uma pessoa a bater, obtemos a manteiga. A nata não pensa para si: ‘Eu virarei manteiga’. Nem mesmo a mão da pessoa pensa para si: ‘Eu farei manteiga’. E a manteiga, também, não pensa para si: ‘Surgirei por mim mesma’. Por meio da ocorrência conjunta de várias relações causais, a manteiga vem a ser. O mesmo se passa com o Tathagata. Ele não pensa e diz: ‘Girarei a Roda-da-Lei’. Oh bom homem! Esse não-advento [não-deliberação das nossas ações; espontaneidade] é senão o giro da Roda-da-Lei. Esse giro da Roda-da-Lei é em si (e ao mesmo tempo) o Tathagata.
Oh bom homem! Através da combinação de coisas tais como corpo (semente), terra, água, fogo, vento, a fertilidade do solo e a estação, um broto (rebento) surge. Oh bom homem! A semente também não diz: ‘Eu evocarei o broto’. Nem o trabalho (o agricultor) em si pensa e diz: ‘Eu evocarei o broto’. Nem o broto diz: ‘Eu surgirei’. O mesmo é o caso com o Tathagata. Até o fim, ele não pensa e diz: ‘Eu faço girar a Roda-da-Lei’. Esse giro da Roda-da-Lei [‘Dharmacakra-pravartana’] é o Tathagata.
Oh bom homem! Como um exemplo: através da conjunção de um tambor, do vazio, do couro e de uma baqueta, obtemos o som de um tambor. O tambor não pensa e diz: ‘Eu evocarei o som’. O mesmo acontece com a baqueta. Nem o som diz: ‘Surgirei’. Oh bom homem! O mesmo se passa com o Tathagata. Até o fim, ele não pensa e diz: ‘Eu giro a Roda-da-Lei’. Oh bom homem! Giro da Roda-da-Lei significa ‘não-feito’. Não-feito é o giro da Roda-da-Lei. O giro da Roda-da-Lei é o Tathagata.
Oh bom homem! Giro da Roda-da-Lei é o que acontece no mundo do Buda-Honrado-pelo-Mundo. Não é algo que possa ser compreendido por Sravakas e Pratyekabudas. Oh bom homem! O espaço não é ser-nascido, nem surgido, nem-feito, nem construído, e nem o que é criado. O mesmo se passa com o Tathagata. Ele não é ser-nascido, nem surgido, nem construído, e nem o que é criado. Assim como para a natureza do Tathagata, é a Natureza-de-Buda. Ela não é um ser-nascido, nem surgido, nem feito, nem construído, e nem o que é criado. ”
Excerto do Sutra do Nirvana, CAP. 20 – Sobre Ações Sagradas 2.
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