Os Apelos de Chandaka

Com lágrimas nos olhos, Chandaka respondeu:

“Oh, como chorarão aqueles que te amam! Você é jovem, é belo, o palácio dos Deuses deveria ser o seu lar; todavia, você viveria nas florestas e dormiria sobre a grama grosseira? Eu sabia da tua cruel decisão; eu não deveria ter ido buscar Kanthaka; mas um poder sobrenatural  ordenou-me, enganou-me, e eu o busquei para você. Como eu poderia ter feito tal coisa da minha própria vontade? A tristeza agora encontrará seu lugar em Kapilavastu. Oh príncipe, seu pai te ama muito, não o abandone! E Mahaprajapati? O que ela não fez por você! Ela é tua mãe adotiva; não seja ingrato! E ainda não há uma outra mulher que te ama? Não abandone a fiel Gopa! Crie seu filho com a ajuda dela, e um dia ele lhe trará glória!”

Ele chorou amargamente. O herói ficou em silêncio. Chanda continuou:

“Você vai deixar a tua família para sempre! Oh, se você deve causar-lhes dor, poupe-me, pelo menos, a angústia de transmitir a triste notícia! O que o rei diria a mim se me visse retornar sem você? O que tua mãe diria a mim? O que Gopa diria? E quando eu aparecer diante de seu pai, você me pede para negar o seu mérito e a sua virtude! Como poderei fazer isso, meu senhor? Não posso mentir. E mesmo se eu decidisse mentir, quem acreditaria em mim? Quem poderia fazer crer que a lua tem vagas de fogo?”

Ele agarrou a mão do herói.

“Não nos abandone! Volte, oh, volte!”

Siddhartha ainda permaneceu em silêncio. Finalmente, ele disse numa voz solene:

“Devemos nos separar, Chanda. Chega um tempo em que pessoas que estão ligadas pelos laços mais fortes devem seguir os seus próprios caminhos. Independente do amor pela minha família, se eu não os deixasse, ainda assim a morte nos separaria, a despeito de tudo. O que sou agora para a minha mãe? O que ela é para mim? Pássaros que dormem na mesma árvore à noite, se dispersam aos quatro ventos no esplendor da aurora; nuvens que algum sopro de vento juntou são dispersadas novamente por algum outro sopro de vento. Não posso mais viver num mundo que nada mais é que um sonho. Devemos nos separar, meu amigo. Diga às pessoas de Kapilavastu que nada fiz digno de culpa, diga-lhes para esquecerem a sua afeição por mim; e diga-lhes também que eles me verão novamente, em breve, (verão) o conquistador da velhice e da morte, a menos que eu falhe miseravelmente e morra.”

Kanthaka estava lambendo seus pés. O herói gentilmente acariciou seu cavalo e falou-lhe como se para um amigo:

“Não chore. Você deve demonstrar ser um animal nobre. Seja paciente. Aproxima-se o tempo em que sua labuta será recompensada.”

A vida do Buda, tr. para o francês por A. Ferdinand Herold [1922], tr. para o inglês por Paul C. Blum [1927], rev. por Bruno Hare [2007], tr. para português brasileiro por Marcos U. C. Camargo [2011].

Fonte: Sacred-Texts em http://www.sacred-texts.com/bud/lob/index.htm

Por muccamargo

Físico, Mestre em Tecnologia Nuclear USP/SP-Brasil, Consultor de Geoprocessamento, Estudioso do Budismo desde 1987.

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