Por seis anos, o herói permaneceu às margens do rio e meditou. Ele nunca procurou abrigo do vento, do sol ou da chuva; permitiu moscas, mosquitos e serpentes picarem-lhe. Estava alheio aos meninos e meninas, aos pastores e lenhadores, que zombavam dele quando passavam e que às vezes atiravam-lhe pó ou lama. Jejuou severamente: uma fruta e alguns grãos de arroz ou gergelim compunham a sua alimentação. Tornou-se muito magro; seus ossos apareciam proeminentemente. Mas sob a sua testa magra, seus olhos dilatados brilhavam como estrelas.

E ainda assim a verdadeira sabedoria não lhe veio. Sentiu que estava tornando-se muito fraco, e percebeu que se ele definhasse, nunca alcançaria o objetivo que havia colocado para si. Então, ele decidiu alimentar-se melhor.
Havia uma aldeia chamada Uruvilva, próxima ao local onde Siddhartha permanecia longas horas em meditação. O líder dessa aldeia tinha dez filhas. Elas reverenciavam o herói, e traziam-lhe grãos e frutos (obtidos) por meio de donativos. Ele raramente tocava esses donativos, mas, certo dia, as meninas noticiaram que ele havia comido tudo o que elas lhe ofereceram. No dia seguinte, elas vieram com um grande prato repleto de arroz cozido, e ele o esvaziou. No dia seguinte, cada uma trouxe uma iguaria diferente, e o herói comeu-as todas. Ele começou a ganhar peso e, em breve, começou ir à aldeia esmolar sua comida. Os moradores competiam entre si na doação de esmolas e, logo, ele recuperou suas forças e sua beleza.
Mas os cinco discípulos que tinham se juntado a ele disseram um ao outro:
“Suas austeridades não lhes conduziram ao caminho da verdadeira sabedoria, e agora ele cessou de praticá-las. Ele toma alimentação abundante; procura o conforto. Ela não pensa mais em praticar ações sagradas. Como ele poderá, agora, atingir a verdadeira sabedoria? Considerávamos-lhe um homem sábio, mas estávamos enganados: ele é um insano e tolo.”
Eles abandonaram-lhe e foram para Benares.
A vida do Buda, tr. para o francês por A. Ferdinand Herold [1922], tr. para o inglês por Paul C. Blum [1927], rev. por Bruno Hare [2007], tr. para português brasileiro por Marcos U. C. Camargo [2011].
Fonte: Sacred-Texts em http://www.sacred-texts.com/bud/lob/index.htm