A Apreensão de Mara

A luz que emanava do corpo do herói penetrou mesmo aqueles domínios onde Mara, o Demônio, reinava supremo. Essa luz deslumbrou Mara, e ele parecia ouvir uma voz dizendo:

“O herói que renunciou à realeza, o filho de Suddhodana, está agora sentado sob a árvore da sabedoria. Ele está concentrando a sua mente, está fazendo o esforço supremo, e logo ele concederá a todas as criaturas a ajuda de que eles necessitam. A estrada que ele tomará, outros tomarão. Uma vez liberto, ele libertará outros. Uma vez que tenha encontrado a paz, ele trará a paz aos outros. Ele entrará no Nirvana, e fará com que outros adentrem. Ele encontrará sabedoria e felicidade, e as concederá aos outros. Por causa dele, a cidade dos Deuses será abarrotada; por causa dele, a cidade do Demônio será abandonada. E você, Mara, um comandante sem exército, um rei sem súditos, não saberá onde tomar refúgio.”

Mara ficou cheio de apreensão. Procurou dormir, mas seu sono foi perturbado por sonhos terríveis. Ele acordou e chamou os seus servos e seus soldados. Quando eles viram-no, ficaram alarmados, e Sarthavaha, um dos seus filhos, disse-lhe:

“Pai, você está pálido e parece infeliz; seu coração palpita e seus lábios tremem. O que você ouviu? O que você viu? Fale!”

“Filho”, respondeu Mara, “os dias da minha soberba terminaram. Ouvi uma voz clamando na luz, a qual disse-me que o filho dos Shakyas sentou-se sob a árvore da sabedoria. E eu tive sonhos horríveis. Uma nuvem negra de poeira assentou sobre o meu palácio. Meus jardins ficaram desnudos de folhas, de flores e de frutos. Meus lagos secaram, e meus cisnes e pavões tiveram suas asas cortadas. E eu me senti só, em meio à desolação. Todos vocês me abandonaram. Minha rainha estava batendo em seu peito e arrancando seus cabelos, como se assombrada pelo remorso. Minhas filhas estavam chorando de angústia, e você, meu filho, estava curvando-se perante esse homem que meditava sob a árvore da sabedoria! Eu queria lutar com o meu inimigo, mas eu não conseguia tirar a minha espada da bainha. Todos os meus súditos fugiram aterrorizados. Uma escuridão impenetrável abateu-se sobre mim, e ouvi meu palácio cair ao chão.”

Sathavaha disse:

“Pai, é desalentador perder uma batalha. Se você viu esses presságios, aguarde sua vez, e não corra o risco de ser derrotado ingloriamente.”

A vida do Buda, tr. para o francês por A. Ferdinand Herold [1922], tr. para o inglês por Paul C. Blum [1927], rev. por Bruno Hare [2007], tr. para português brasileiro por Marcos U. C. Camargo [2011].

Fonte: Sacred-Texts em http://www.sacred-texts.com/bud/lob/index.htm

Por muccamargo

Físico, Mestre em Tecnologia Nuclear USP/SP-Brasil, Consultor de Geoprocessamento, Estudioso do Budismo desde 1987.

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