O Mestre permaneceu em Cravasti por algum tempo; então, deixou a cidade para retornar à Rajagriha, onde o Rei Bimbisara o aguardava. Ele havia parado para descansar numa aldeia ao meio do caminho, quando viu sete homens aproximando-se. Ele os reconheceu. Seis eram parentes, e estavam entre os mais ricos e mais poderosos dos Shakyas. Seus nomes eram Aniruddha, Bhadrika, Bhrigu, Kimbala, Devadatta e Ananda. O sétimo era um barbeiro chamado Upali.
Aniruddha, um dia havia dito para si que era uma desgraça que nenhum dos Shakyas tivesse se prontificado a seguir o Buda. Ele decidiu dar um bom exemplo, e como não havia nenhuma razão para esconder a sua intenção, ele a revelou primeiro para Bhadrika, que era o seu melhor amigo. Bhadrika aprovou a sua decisão, e depois de pensar um pouco, decidiu fazer o mesmo. Então, esses dois conquistaram Ananda, Bhrigu, Kimbala e Devadatta; por convencê-los de que não havia uma vocação mais elevada que aquela de um monge.
Os seis príncipes, então, partiram para juntar-se ao Buda. Eles mal tinham deixado Kapilavastu quando Ananda, olhando para Bhadrika, exclamou:
“Como agora, Bhadrika, você levaria uma vida de santidade, e manteria todos as suas jóias?”
Bhadrika enrubesceu; mas então viu que Ananda também estava usando suas jóias, e respondeu sorridente:
“Olhe para si, Ananda.”
E agora foi Ananda que enrubesceu.
Após o que todos se entreolharam, e perceberam que todos ainda estavam usando as suas jóias. Isso lhes fez sentirem-se envergonhados; baixaram seus olhares, e seguiram caminhando em silêncio ao longo da estrada quando encontraram o barbeiro Upali.
“Barbeiro”, disse Ananda, “Tome minhas jóias, dou-lhes a você!”
“E tome as minhas!”, disse Bhadrika.
Os outros também entregaram as suas jóias a Upali. Ele ficou à procura de uma explicação. Por que aqueles príncipes, que nunca o haviam visto antes, deveriam dar-lhe tais presentes? Ele deveria aceitá-los? Deveria recusá-los?
Aniruddha compreendeu a hesitação do Barbeiro. Então disse-lhe:
“Não tenha receio de aceitar essas jóias. Estamos a caminho para juntarmo-nos ao grande eremita que nasceu para os Shakyas, estamos a caminho para juntarmo-nos a Siddhartha, que tornou-se o Buda. Ele nos instruirá na sabedoria, e nos submeteremos à sua lei.”
“Príncipes”, indagou o barbeiro, “vocês se tornarão monges?”
“Sim”, eles responderam.
Ele então pegou as jóias e partiu para a cidade. Mas, subitamente, ele pensou: “Estou agindo como um tolo. Quem acreditaria que os príncipes jogaram essas riquezas sobre mim? Eu serei tomado por um ladrão, ou talvez por um assassino. O mínimo que pode me acontecer é incorrer no profundo desagrado dos Shakyas. Não devo ficar com as jóias”. Ele pendurou-as numa árvore que ficava à beira da estrada. E pensou: “Aqueles príncipes estão dando um nobre exemplo. Eles tiveram a coragem de deixar seus palácios; a mim, que nada sou, faltaria coragem de deixar o meu negócio? Não! Eu os seguirei. Eu, também, irei ao Buda, ele deverá aceitar-me na comunidade!”
Ele seguiu os príncipes à distância. Ele estava tímido quanto a juntar-se a eles. Porém, aconteceu que Bhadrika voltou-se para trás. Ele viu Upali, e lhe chamou.
“Barbeiro, por que você jogou fora as nossas jóias?”, ele perguntou.
“Eu, também, quero tornar-me um monge”, respondeu o barbeiro.
“Então siga-nos”, disse Bhadrika.
Mas Upali ainda ficou para trás. Aniruddha disse-lhe:
“Caminhe ao nosso lado, barbeiro. Monges não fazem distinções, exceto para a idade e para a virtude. Quando estivermos diante do Buda, você deve ser o primeiro a dirigir-se a ele, bem como o primeiro a indagar-lhe quanto a recebê-lo na comunidade. Por condescender a você, os príncipes demonstrarão que deixaram de lado o seu orgulho de Shakya.”
Continuaram em seu caminho. De repente, um falcão desceu sobre a cabeça de Devadatta e arrancou um diamante que ele estava usando em seu cabelo. Isso expôs a sua vaidade, e fez com que os príncipes rissem. Devadatta, agora, não tinha mais uma única jóia, mas seus companheiros, em seus corações, ainda questionavam a sinceridade de sua fé.
A vida do Buda, tr. para o francês por A. Ferdinand Herold [1922], tr. para o inglês por Paul C. Blum [1927], rev. por Bruno Hare [2007], tr. para português brasileiro por Marcos U. C. Camargo [2011].
Fonte: Sacred-Texts em http://www.sacred-texts.com/bud/lob/index.htm