O príncipe respondeu:
“Prometa-me quatro coisas, oh pai, e não deixarei vossa casa para recolher-me às florestas.”
“Quais são elas, filho?”, indagou o rei.
“Prometa-me que minha vida não terminará com a morte, que a doença não prejudicará a minha saúde, que a velhice não se seguirá à minha juventude, que o infortúnio não destruirá a minha prosperidade.”
“Você está pedindo demais”, respondeu o rei. “Desista dessa ideia. Não é bom agir sob um impulso tolo.”
Solene como a montanha Meru, o príncipe disse ao seu pai:
“Se você não pode me prometer essas quatro coisas, não me retenha, oh pai. Quando alguém está tentando escapar de uma casa em chamas, não devemos impedi-lo. Inevitavelmente, virá o dia quando deveremos deixar este mundo, mas que mérito há numa separação involuntária (forçada)? Uma separação voluntária é longinquamente melhor. A morte me levaria do mundo antes que eu alcançasse o meu objetivo, antes que eu satisfizesse meu ardor. O mundo é uma prisão: eu poderia libertar aqueles seres que são prisioneiros do desejo! O mundo é um profundo abismo onde vagueiam o ignorante e o cego: eu acenderia a lâmpada da sabedoria, removeria a película que esconde a luz da sabedoria! O mundo tem levantado a bandeira errada, tem levantado a bandeira do orgulho: eu poderia puxá-la abaixo, poderia rasgar em pedaços a bandeira do orgulho! O mundo é conturbado, o mundo é um turbilhão, o mundo é uma roda de fogo: eu poderia, com a verdadeira lei, trazer a paz a todos os homens!”
Com lágrimas nos olhos, ele retornou ao palácio. No grande salão as acompanhantes de Gopa estavam rindo e cantando. Ele não lhes deu atenção. A noite veio, e elas ficaram em silêncio.
Elas caíram no sono. O príncipe as olhou.
Foi-se a sua graça premeditada (ensaiada), foi-se o brilho dos seus olhos. Seus cabelos estavam desgrenhados, suas bocas abertas, seus braços e pernas estavam rigidamente esticados ou desajeitadamente retorcidos sob seus corpos. E o príncipe gritou:
“Mortas! Elas estão mortas! Encontro-me num cemitério!”
E as deixou, fazendo seu caminho em direção aos estábulos reais.
A vida do Buda, tr. para o francês por A. Ferdinand Herold [1922], tr. para o inglês por Paul C. Blum [1927], rev. por Bruno Hare [2007], tr. para português brasileiro por Marcos U. C. Camargo [2011].
Fonte: Sacred-Texts em http://www.sacred-texts.com/bud/lob/index.htm